Beleza Falada #07 – Dama Mecânica
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Para você que ainda não conhece, Beleza Falada é um projeto do BelezaGeek para criação e divulgação de audiocontos e audiobooks. Confira agora o episódio 7 do projeto.
Dama Mecânica é um conto sobre pai e filho que compartilham a mesma paixão pelo trabalho, embora discordem em algumas coisas. Depois de muitos anos de mistério sobre histórias da família, o filho finalmente escuta sobre algumas delas, quando uma tragédia acontece. Escrito por nosso parceiro Jordan Florio de Oliveira. Conheça sua página no Facebook e leia outros contos em seu Wattpad. Contamos também com nosso colaborador anônimo interpretando o filho e Vitor Hugo Mota fazendo a parte do pai. Excelente interpretação de ambos. Conheça o trabalho do Vitor Hugo visitando seu site Chá dos Cinco.
Clique no play abaixo e ouça esse conto.
Dama Mecânica Download audio file (Beleza-Falada-07-Dama-Mecanica.mp3) Autor: Jordan Florio de Oliveira Narração e edição: Bruna Evelyn Voz pai: Vitor Hugo Mota Voz filho: Colaborador anônimo |
DOWNLOAD: Clique AQUI com o botão direito do mouse e escolha a opção “Salvar Link Como” para baixar o arquivo no formato MP3.
Em uma velha relojoaria, com relógios-cuco na parede mal iluminada, peças por todos os lados, trabalham um homem e seu filho. O relojoeiro já é idoso, e como a sua arte, foi se tornando cada vez mais embotado e esquecido pelas pessoas ao seu redor. Fora os costumases clientes, que eram o único motivo da loja ainda conseguir, pelo menos, se manter aberta, existiam muito poucas pessoas que tinham a curiosidade de entrar.
O filho, que na verdade não é exatamente filho do velho relojoeiro, mas sim um sobrinho órfão por ele adotado, sempre foi apaixonado pela profissão do “pai”, defendendo o retorno dos relógios de bolso e a troca das “porcarias digitais feitas na China que não duram 6 meses” por relógios de corda, quase artesanais, do tipo que ele e o pai faziam naquela oficina.
Apesar disso, ele sabia que, se não houvesse uma guinada nos planos, objetivos e mercado da relojoaria, logo as despesas ficariam insuportáveis e eles teriam de alugar a loja. Talvez para algum cabeleireiro ou pequeno magazine de roupas, tão comuns na região onde eles estavam.
Mudanças, porém, não era um assunto fácil entre os dois.
Eles discutiam acaloradamente na mesa de jantar, às vezes até incomodando os outros membros da família, pois ambos tinham tanta paixão pelo ofício, mas tinham pontos de vista bem divergentes em vários assuntos.
– Não vou começar a vender jóias, já te disse rapaz. Isso atrai ladrão, fora que eu não mexo com isso a mais de anos, nem sei mais se ainda sei gravar em ouro.
– Pai, pagamos a porcaria do condomínio daquela galeria para termos segurança lá, você podia pelo menos tentar. Você sabe que as pessoas já não querem mais relógios para a vida inteira, elas se cansam das coisas rápido demais, precisamos…
– Você precisa parar de pensar bobagens. Eu sustentei você e seus irmãos com os relógios, não é agora que eu vou mudar os negócios.
O tom do pai demonstra que a discussão está acabada. O rapaz se recolhe em pensamentos e volta a comer em silêncio, o que não significa que ele deixou de pensar naquilo que viu uma vez.
A caixa vermelha.
Ele descobriu a fatídica caixa de pandora de seu pai por acaso, enquanto fazia uma arrumação geral da oficina da loja, e ao mostrá-la ao pai, viu sua face se modificar em tantos matizes que não entendeu afinal o que havia naquela caixa.
Logicamente o velho relojoeiro se negou a responder qualquer coisa sobre a caixa, dizendo que era um fantasma do passado e que era melhor deixá-lo lá. Mas o jovem insistiu por mais de uma hora, até que ele realmente se irritou e disse, entre dentes:
– Quando você chegar a minha idade vai saber que existem certas lembranças que doem tanto, que é melhor esquecê-las.
Na época o rapaz se contentou com isso, mas depois da conversa que ele tem com sua mãe enquanto os dois limpam a cozinha do jantar, ele sabe que tem de fazer alguma coisa. O irmão mais velho vai se mudar e levar consigo boa parte dos rendimentos da casa, e o pai deles, orgulhoso de manter o nível de vida da família com o suor de sua testa na relojoaria da família, não iria suportar perceber que a casa já não é mais sustentada por ele.
Por isso mesmo ele pensou de novo na caixa. Por algum motivo ele suspeita que as respostas dos problemas da relojoaria estejam ali.
Ele espera a quarta-feira, o dia em que seu pai sai depois do almoço para jogar cartas com os amigos no bar próximo, e coloca a caixa em cima da bancada de trabalho. Não existem trabalhos para serem retirados por clientes, por isso mesmo, ele se posiciona na bancada, onde consegue tanto ver a loja quanto esconder no que está trabalhando, de alguém que entre de repente.
A caixa em si já é um artefato curioso, já que com certeza fora feita por mãos habilidosas, em um tempo em que as coisas eram feitas para durar. Mas o que mais chamava a atenção é a fechadura, que não tem espaço para chaves comuns, somente um conjunto de engrenagens, muito similares as de um relógio.
Percebendo que aquilo é um quebra cabeça, o rapaz começa a manipular as engrenagens, tentando entender o mecanismo, o que se prova totalmente infrutífero, já que quando uma engrenagem se move, a outra toma seu lugar, deixando tudo praticamente como estava no início.
Antes que ele consiga ter alguma idéia diferente, o pai retorna a loja, com um sorriso levemente alcoólico, e assoviando uma canção que o rapaz não conhece.
– E aí, pai, como foi lá com os seus amigos? – O rapaz conversa com o pai enquanto disfarçadamente coloca a caixa de volta no seu lugar.
– Foi divertido, filhão. – O homem está realmente alcoolizado, pois não chama nenhum dos filhos de “filhão” enquanto sóbrio. Fora que ele dança pela loja, como se lembrasse de algum baile antigo e esquecido nas poeiras do passado.
– Filhão, eu já te contei que esta loja era do seu avô antes de ser minha?
O rapaz arregala os olhos, pois o avô é assunto restritamente proibido. Desde que ele e seus “irmãos” eram crianças, o nome dele é esparsamente citado e nunca na gente do pai, pois o sofrimento dele com a morte de seu pai é tão intenso e dolorido, que, às vezes, ele se tranca na pequena oficina existente em casa e chora, por horas sem fim, e todos na casa se preocupam, mas não podem fazer nada.
– Não, pai. Você quase não fala do vovô.
– Não falo porque aquele velho demente me deixou uma relojoaria, me ensinou tudo sobre relógios, mas somente quando era tarde demais ele me disse o que realmente queria que eu fizesse da minha vida, mas eu nunca fui realmente capaz de fazê-lo, meu filho.
O rapaz está cada vez mais curioso. Seu pai está sorrindo e cantando, falando sobre coisas que ele nem sabia, sobre os pais biológicos dele, sobre o acidente que os matou. Tantas coisas que ele perguntou por anos a fio, sem resposta, fora o usual “Você está desocupado para ficar pensando nessas coisas? Vem cá que eu arrumo um serviço para ocupar sua cabeça”.
O velho homem continua dançando desajeitadamente pela loja, quando bruscamente ele cai, gritando de maneira assustadora e desesperada.
Quando levado ao hospital, descobre-se que o animado relojoeiro, marido amável e pai zeloso, teve um acidente vascular cerebral e entrou em coma.
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