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Macron conta com “fragmentação” da esquerda e da extrema direita para vencer eleições, dizem especialistas

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Quais as consequências do avanço da extrema direita no Parlamento Europeu? O que levou o presidente francês Emmanuel Macron a dissolver a Assembleia Nacional? De acordo com especialistas ouvidos pela RFI, os últimos acontecimentos trazem mais incerteza do que garantia de sucesso para qualquer um dos lados do espectro político.

Maria Paula Carvalho, da RFI em Paris

“A extrema direita tem uma dificuldade de fazer um único bloco unido”, destaca Tomás de Barros, pesquisador associado ao Centro de Pesquisas Políticas da SiencePo, em Paris, sobre a fragmentação do campo liderado na França por Jordan Badella e Marine Le Pen, do partido Reunião Nacional. O grupo conquistou neste domingo (9) quase um terço dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu e se posiciona bem à frente da aliança centrista do presidente Emmanuel Macron.

“Existem muitos grupos de extrema direita que ainda não conseguiram se unificar. Ela [a extrema direita] vai ter mais peso na decisão de quem será o próximo comissário europeu, para definir quais serão as políticas da União Europeia no próximo período, vai fazer barulho no Parlamento Europeu e usá-lo para catapultar pautas em seus respectivos países. Mas ela não conseguiu se impor”, explica o cientista político. “Não é que agora o Parlamento Europeu está dominado pela extrema direita. A legenda apenas cresceu um pouco de tamanho em detrimento de todos os grupos, mas, principalmente, do grupo dos liberais, do qual o partido do Emmanuel Macron faz parte”, analisa.

Ao dissolver a Assembleia Nacional, Macron também estaria apostando nas divisões dentro da esquerda. Tomás de Barros explica que o centrista estava “encurralado”, uma vez que já não tinha maioria no Legislativo e sofreu uma derrota simbólica nas eleições europeias. “Em 2022, houve um movimento para as eleições legislativas, em que todos os partidos de esquerda se unificaram na nova União Popular, Ecológica e Social, a NUPES”, lembra o pesquisador. Essa união de esquerda, inédita nos últimos 40 anos, conseguiu um bom resultado nas urnas. Porém, nos últimos dois anos, ela se se mostrou “muito frágil” e com várias divergências, aponta. “Sobretudo com o conflito na Ucrânia e com a questão no Oriente Médio. Isso tudo realmente transformou em pó essa união de esquerda, que saiu fragmentada para as eleições europeias”, analisa.

Para o cientista político, Macron confia que a esquerda não vai conseguir se reunir novamente, uma chance para ele se apresentar como o “salvador da democracia”. “Dessa maneira, ele conseguiria ir para o segundo turno e usar o discurso 'ou eu, ou o caos, ou eu ou a extrema direita', e assim tentar constituir uma maioria no Parlamento, o que é desafiador, mas ao menos reduzir as perdas e obrigar esses outros grupos políticos a comporem com ele, tentando hegemonizar esse campo do anti-extrema direita”, acrescenta.

Normalização da extrema direita

Outro ponto destacado pelo pesquisador é o esforço de alguns centristas em tentar normalizar as ações da extrema direita. “Por um lado, políticos como a Marine Le Pen, aqui na França, ou a Giorgia Meloni, na Itália, vão tentar se apresentar como candidatas normais, razoáveis, candidatas de centro, afastando dos seus movimentos e de grupos aliados setores que sejam virulentos, barulhentos, às vezes ligados a grupos neonazistas”, acredita. “Elas vão tentar tomar uma distância e se mostrar como direitistas pragmáticas. Isso é um movimento de normalização. O outro movimento é quando o centro acaba indo para a extrema direita, reproduzindo algumas das suas pautas para tentar capturar esse eleitorado”, explica.

Um exemplo disso foi a tentativa de endurecimento das regras de imigração por parte do governo Macron, com a supressão do direito de solo aos filhos de migrantes nascidos na França, um projeto que depois teve vários artigos considerados inconstitucionais pelo Conselho Constitucional francês. “Ele tentou fazer esse movimento para agradar o eleitorado de extrema direita, mas são raros os casos em que isso funciona, porque o eleitor vai sempre preferir o original à cópia” observa Tomás de Barros.

Dissolução da Assembleia Nacional é estratégia “rara” e “arriscada”

A decisão do presidente Emmanuel Macron de dissolver a Assembleia Nacional surpreendeu a França. A última vez em que isso aconteceu foi em 1997, quando o conservador Jacques Chirac dissolveu a Assembleia e perdeu a maioria, resultando em um período de coabitação com o primeiro-ministro socialista Lionel Jospin.

Quase trinta anos depois, muitos se perguntam qual é a estratégia de Emmanuel Macron. A historiadora Sílvia Capanema, da universidade Sorbonne, acredita que o plano possa ter dois objetivos. “O que ele pretende com isso? Criar uma maioria, já que ele tem uma maioria muito frágil, mas que pode ficar mais frágil ainda, ou entregar o poder para a extrema direita e tentar recuperar nas eleições de 2027, se colocando como a única alternativa”, explica a professora.

Para isso, Emmanuel Macron teria de renunciar ao cargo de presidente, uma vez que já tem dois mandatos consecutivos, número máximo permitido por lei. “Ele fez isso de forma calculada”, analisa Capanema. “Ele provavelmente tem um plano A e um plano B: tentar reconstruir uma maioria com a direita e talvez seduzir o centro ou uma centro esquerda, se colocando como alternativa e, em um plano B, se a extrema direita ganhar, deixar que ela não consiga governar, como a gente já viu em outros lugares. Mas tudo isso é um risco enorme”, completa.

Já uma aliança do bloco presidencial com a esquerda seria um cenário muito improvável, acredita Capanema. Ela explica que o centrista “não representa de forma nenhuma a esquerda”, conforme apontado em vários movimentos sociais. “Ele não vai representar uma frente democrática contra a extrema direita nunca. Agora, pode acontecer uma união das esquerdas, que é o que está se articulando, para tentar construir uma maioria”.

A historiadora explica que essa alternativa exigiria consenso em temas muito importantes para o povo francês, como serviços públicos, aposentadoria, ecologia, salários e a questão da Palestina. “Seria uma configuração em que a esquerda se articula em termos sociais, ecológicos, de cidadania e internacional, e que colocaria esse centro do Macron, o centro direita, no lugar que eles estão: da derrota e do fracasso e o levaria ao enfrentamento contra uma extrema direita, onde tem fascistas e a direita tradicional”, avalia.

Ambos os pesquisadores temem as consequências possíveis de um governo de extrema direita na França, especialmente para a população de imigrantes e muçulmanos, mas também para os militantes da esquerda e ecologistas. Ao mesmo tempo, admitem que as forças conservadoras vieram para ficar no espectro político, citando como exemplo o Bolsonarismo no Brasil e os seguidores de Donald Trump, nos Estados Unidos.

“Virar a chave”

Douglas Mansur, professor e cientista social da Universidade Federal Fluminense (UFF), destaca que “apesar da França ter sido uma das bases do pensamento e de políticas social-democratas ou mesmo de um liberalismo com alguma sensibilidade social, também foi e é um dos berços do pensamento conservador”. Em entrevista àRFI Brasil, o pesquisador explica que “há séculos há um núcleo duro desse tipo de pensamento na sociedade francesa”. A diferença, acrescenta, é que esse grupo tem crescido nos últimos anos, apesar de “já ter sido significativo em outros momentos, como no período do general De Gaulle”.

Para Mansur, a estratégia de Macron de antecipar as eleições tem a ver com uma “tentativa de apaziguamento e de alertar para o que representa esse tipo de governo conservador e, assim, tentar conseguir unidade e alianças”.

Outra análise seria que Macron quer “virar a chave” sobre o assunto eleições ainda “antes dos Jogos Olímpicos Paris 2024, que, por si só, já trazem tensão ante os conflitos que estamos vivendo no mundo, mas podem significar, também, uma narrativa sobre fraternidade entre os povos”, conclui o cientista político.

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Maria Paula Carvalho, da RFI em Paris

“A extrema direita tem uma dificuldade de fazer um único bloco unido”, destaca Tomás de Barros, pesquisador associado ao Centro de Pesquisas Políticas da SiencePo, em Paris, sobre a fragmentação do campo liderado na França por Jordan Badella e Marine Le Pen, do partido Reunião Nacional. O grupo conquistou neste domingo (9) quase um terço dos votos nas eleições para o Parlamento Europeu e se posiciona bem à frente da aliança centrista do presidente Emmanuel Macron.

“Existem muitos grupos de extrema direita que ainda não conseguiram se unificar. Ela [a extrema direita] vai ter mais peso na decisão de quem será o próximo comissário europeu, para definir quais serão as políticas da União Europeia no próximo período, vai fazer barulho no Parlamento Europeu e usá-lo para catapultar pautas em seus respectivos países. Mas ela não conseguiu se impor”, explica o cientista político. “Não é que agora o Parlamento Europeu está dominado pela extrema direita. A legenda apenas cresceu um pouco de tamanho em detrimento de todos os grupos, mas, principalmente, do grupo dos liberais, do qual o partido do Emmanuel Macron faz parte”, analisa.

Ao dissolver a Assembleia Nacional, Macron também estaria apostando nas divisões dentro da esquerda. Tomás de Barros explica que o centrista estava “encurralado”, uma vez que já não tinha maioria no Legislativo e sofreu uma derrota simbólica nas eleições europeias. “Em 2022, houve um movimento para as eleições legislativas, em que todos os partidos de esquerda se unificaram na nova União Popular, Ecológica e Social, a NUPES”, lembra o pesquisador. Essa união de esquerda, inédita nos últimos 40 anos, conseguiu um bom resultado nas urnas. Porém, nos últimos dois anos, ela se se mostrou “muito frágil” e com várias divergências, aponta. “Sobretudo com o conflito na Ucrânia e com a questão no Oriente Médio. Isso tudo realmente transformou em pó essa união de esquerda, que saiu fragmentada para as eleições europeias”, analisa.

Para o cientista político, Macron confia que a esquerda não vai conseguir se reunir novamente, uma chance para ele se apresentar como o “salvador da democracia”. “Dessa maneira, ele conseguiria ir para o segundo turno e usar o discurso 'ou eu, ou o caos, ou eu ou a extrema direita', e assim tentar constituir uma maioria no Parlamento, o que é desafiador, mas ao menos reduzir as perdas e obrigar esses outros grupos políticos a comporem com ele, tentando hegemonizar esse campo do anti-extrema direita”, acrescenta.

Normalização da extrema direita

Outro ponto destacado pelo pesquisador é o esforço de alguns centristas em tentar normalizar as ações da extrema direita. “Por um lado, políticos como a Marine Le Pen, aqui na França, ou a Giorgia Meloni, na Itália, vão tentar se apresentar como candidatas normais, razoáveis, candidatas de centro, afastando dos seus movimentos e de grupos aliados setores que sejam virulentos, barulhentos, às vezes ligados a grupos neonazistas”, acredita. “Elas vão tentar tomar uma distância e se mostrar como direitistas pragmáticas. Isso é um movimento de normalização. O outro movimento é quando o centro acaba indo para a extrema direita, reproduzindo algumas das suas pautas para tentar capturar esse eleitorado”, explica.

Um exemplo disso foi a tentativa de endurecimento das regras de imigração por parte do governo Macron, com a supressão do direito de solo aos filhos de migrantes nascidos na França, um projeto que depois teve vários artigos considerados inconstitucionais pelo Conselho Constitucional francês. “Ele tentou fazer esse movimento para agradar o eleitorado de extrema direita, mas são raros os casos em que isso funciona, porque o eleitor vai sempre preferir o original à cópia” observa Tomás de Barros.

Dissolução da Assembleia Nacional é estratégia “rara” e “arriscada”

A decisão do presidente Emmanuel Macron de dissolver a Assembleia Nacional surpreendeu a França. A última vez em que isso aconteceu foi em 1997, quando o conservador Jacques Chirac dissolveu a Assembleia e perdeu a maioria, resultando em um período de coabitação com o primeiro-ministro socialista Lionel Jospin.

Quase trinta anos depois, muitos se perguntam qual é a estratégia de Emmanuel Macron. A historiadora Sílvia Capanema, da universidade Sorbonne, acredita que o plano possa ter dois objetivos. “O que ele pretende com isso? Criar uma maioria, já que ele tem uma maioria muito frágil, mas que pode ficar mais frágil ainda, ou entregar o poder para a extrema direita e tentar recuperar nas eleições de 2027, se colocando como a única alternativa”, explica a professora.

Para isso, Emmanuel Macron teria de renunciar ao cargo de presidente, uma vez que já tem dois mandatos consecutivos, número máximo permitido por lei. “Ele fez isso de forma calculada”, analisa Capanema. “Ele provavelmente tem um plano A e um plano B: tentar reconstruir uma maioria com a direita e talvez seduzir o centro ou uma centro esquerda, se colocando como alternativa e, em um plano B, se a extrema direita ganhar, deixar que ela não consiga governar, como a gente já viu em outros lugares. Mas tudo isso é um risco enorme”, completa.

Já uma aliança do bloco presidencial com a esquerda seria um cenário muito improvável, acredita Capanema. Ela explica que o centrista “não representa de forma nenhuma a esquerda”, conforme apontado em vários movimentos sociais. “Ele não vai representar uma frente democrática contra a extrema direita nunca. Agora, pode acontecer uma união das esquerdas, que é o que está se articulando, para tentar construir uma maioria”.

A historiadora explica que essa alternativa exigiria consenso em temas muito importantes para o povo francês, como serviços públicos, aposentadoria, ecologia, salários e a questão da Palestina. “Seria uma configuração em que a esquerda se articula em termos sociais, ecológicos, de cidadania e internacional, e que colocaria esse centro do Macron, o centro direita, no lugar que eles estão: da derrota e do fracasso e o levaria ao enfrentamento contra uma extrema direita, onde tem fascistas e a direita tradicional”, avalia.

Ambos os pesquisadores temem as consequências possíveis de um governo de extrema direita na França, especialmente para a população de imigrantes e muçulmanos, mas também para os militantes da esquerda e ecologistas. Ao mesmo tempo, admitem que as forças conservadoras vieram para ficar no espectro político, citando como exemplo o Bolsonarismo no Brasil e os seguidores de Donald Trump, nos Estados Unidos.

“Virar a chave”

Douglas Mansur, professor e cientista social da Universidade Federal Fluminense (UFF), destaca que “apesar da França ter sido uma das bases do pensamento e de políticas social-democratas ou mesmo de um liberalismo com alguma sensibilidade social, também foi e é um dos berços do pensamento conservador”. Em entrevista àRFI Brasil, o pesquisador explica que “há séculos há um núcleo duro desse tipo de pensamento na sociedade francesa”. A diferença, acrescenta, é que esse grupo tem crescido nos últimos anos, apesar de “já ter sido significativo em outros momentos, como no período do general De Gaulle”.

Para Mansur, a estratégia de Macron de antecipar as eleições tem a ver com uma “tentativa de apaziguamento e de alertar para o que representa esse tipo de governo conservador e, assim, tentar conseguir unidade e alianças”.

Outra análise seria que Macron quer “virar a chave” sobre o assunto eleições ainda “antes dos Jogos Olímpicos Paris 2024, que, por si só, já trazem tensão ante os conflitos que estamos vivendo no mundo, mas podem significar, também, uma narrativa sobre fraternidade entre os povos”, conclui o cientista político.

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